sábado, 28 de outubro de 2017

Moonspell – 1755 (2017)


Moonspell – 1755 (2017)
(Napalm Records – Importado)


01. Em Nome do Medo
02. 1755
03. In Tremor Dei
04. Desastre
05. Abanão
06. Evento
07. 1 de Novembro
08. Ruínas
09. Todos os Santos
10. Lanterna dos Afogados (Paralamas do Sucesso Cover)

Lisboa, 1 de Novembro de 1755. Era a manhã do Dia de Todos os Santos, com Igrejas e ruas lotadas por sua população, extremamente devota ao catolicismo. E quando falamos de Lisboa dessa época, é de uma cidade que se diferenciava muito do que conhecemos hoje, pois tinha um aspecto tipicamente medieval, com ruas estreitas, desalinhadas e desorganizadas. Sua população era estimada em 300 mil habitantes. Sendo assim, imaginem a aglomeração de pessoas nessas mesmas ruas, nessa manhã de feriado religioso. Eis então que entre 9:30 e 9:40 da manhã, o mundo pareceu acabar.

Um terremoto com epicentro no mar, que atingiu entre 8,7 e 9,0 na escala Richter (que vai até 10), caiu em cheio sobre a cidade. Estima-se que 1/3 de suas construções ruíram nesse momento. As réplicas foram sentidas por um período de mais de 2 horas. Uma parte dos sobreviventes correu para a zona portuária, para nela se abrigar, sem imaginar o que estava por vir. O mar se retraiu, a ponto de poder ser avistado seu fundo, além de destroços de navios e cargas perdidas, e pouco depois um tsunami, com ondas de até 20 metros, atingiu Lisboa, varrendo cidade adentro e inundando diversas áreas. Imaginem o tamanho do terror que se espalhou entre a devota população lisboeta enquanto tudo isso ocorria. E como se não bastasse, boa parte do que ficou em pé acabou consumida por incêndios que duraram cerca de 5 dias. Estudos modernos estimam que cerca de 85% das construções foram destruídas e que algo entre 70 mil e 90 mil pessoas tiveram suas vidas ceifadas.


O impacto que tal desastre teve na sociedade portuguesa foi profundo. Pode-se dizer que mudou a história do país. E foi desse acontecimento que o Moonspell resolveu tratar em seu 12º trabalho de estúdio, simplesmente intitulado 1755. E para aumentar a força de tal escolha, optaram por cantar todas as canções em seu idioma pátrio, o que adianto desde já, foi realmente a escolha mais correta. Cantar na língua portuguesa não é uma novidade para o grupo, já que em diversos momentos da carreira o fizeram, sempre obtendo ótimos resultados, e sendo assim, tal opção não deveria ser motivo de preocupação para os fãs. Ao contrário, é algo a ser louvado, visto que muitos já sonhavam com a oportunidade de escutar um álbum todo cantado em português.

Musicalmente, uma coisa é indiscutível. O Moonspell sempre prezou pela integridade, por fazer o que quis, mesmo que isso tenha tido resultado discutíveis em alguns momentos, como The Butterfly Effect (99) e Darkness and Hope (01). Também não dá para discutir que mesmo em seus momentos mais questionáveis, conseguiu manter uma identidade sua, que é a mescla de agressividade com boas melodias góticas, além de sempre buscar não se repetir. Diversidade é uma palavra que se encaixa bem em sua obra. E olhe, podemos dizer que também pode ser aplicada em 1755, seu trabalho mais variado e rico até hoje.


Eis um álbum fascinante, que a cada audição cresce aos nossos ouvidos, pois vamos captando cada detalhe existente nele (e que não são poucos). Temos aqui uma incrível junção de Doom, Gothic Metal e Metal Sinfônico, onde momentos agressivos convivem com passagens épicas e grandiosas, com grandes coros e orquestrações, além de claro, aquele goticismo inerente à música do Moonspell. Além disso, conseguem de uma forma simplesmente incrível transpor para as canções a dor dos que sofreram com a devastação de 1755. Sua música é profunda, altamente emocional e em muitas passagens, você consegue se sentir vivendo o acontecimento. Você sente o terror do momento. Quantas bandas por aí podem se gabar de conseguir alcançar tal resultado? Poucas, amigos, bem poucas.

De cara, temos uma nova versão para “Em Nome do Medo”, uma das melhores canções de Alpha Noir, álbum de 2012. A letra se encaixa perfeitamente dentro do contexto do trabalho, e ganhou arranjos orquestrais simplesmente incríveis. Os vocais de Fernando, as orquestrações, os corais, tudo isso acabou por criar um clima de escuridão que soa perfeito para abrir um trabalho dessa magnitude. Na sequência, “1755” chega carregada de vigor e de força. Com uma diversidade impressionante, se destaca não só pelos riffs, como por suas partes sinfônicas, pelos coros e por uma saudável influência de sonoridades orientais. Em seguida, temos um dos pontos altos do álbum, a poderosa “In Tremor Dei”, canção recheada de detalhes, com um trabalho incrível do baixista Aires Pereira e participação mais do que especial do fadista Paulo Bragança, que terminou por dar grande profundidade e emoção à composição. “Desastre” chega intensa, escura e pesada, com ótimo trabalho vocal e um clima teatral que lhe faz profunda. Encerrando a primeira metade, temos “Abanão”, com boa dose de agressividade, ótimos coros e trabalho primoroso do baterista Miguel Gaspar.


A segunda metade abre com a ótima “Evento”, a mais diversificada de 1755. Aqui, além de ótimas melodias, temos uma alternância muito legal de passagens mais agressivas e velozes, com outras mais atmosféricas. As guitarras de Pedro Paixão e Ricardo Amorim também executam um belíssimo trabalho, com ótimos riffs e solo, algo que se repete na música seguinte, “1 de Novembro”. Aqui, temos boas melodias, ótimas orquestrações e mudanças de tempo interessantes. Já “Ruínas” possui uma forte carga emocional, com certa carga de melancolia e uma aura de desespero. Além disso, é outra que tem ótima utilização de elementos orientais. “Todos os Santos” é, sem sombra alguma, uma das mais fortes canções aqui presentes. É daquelas músicas onde o Moonspell mostra toda a sua capacidade de unir passagens mais agressivas com boas melodias e uma pegada gótica. Reflete perfeitamente o que é a banda. Encerrando o álbum, uma surpreendente versão para “Lanterna dos Afogados”, do Paralamas do Sucesso, uma música que nós brasileiros conhecemos muito bem. Peso e suavidade, características antagônicas em um primeiro momento, se unem para gerar uma aura triste, escura e melancólica, que se destaca principalmente pelas belíssimas orquestrações (o piano ficou perfeito aqui) e se mostra o encerramento perfeito para o álbum.

A produção ficou por conta do dinamarquês Tue Madsen, que já trabalhou com a banda no passado, e o resultado é simplesmente incrível. A forma como ele conseguiu deixar o som limpo e claro, a ponto de escutarmos cada detalhe, mas sem tirar a agressividade e o peso, foi simplesmente incrível. Uma das melhores produções que escutei em 2017. Já a bela capa é obra do português João Diogo e reflete perfeitamente o conteúdo lírico do álbum. Com um trabalho simplesmente fascinante e viciante, o Moonspell parece ter alcançado seu auge e conseguido o que parecia improvável, superar os clássicos Wolfheart (95) e Irreligious (96). Emocional, como o tema pede, 1755 se credencia como sério concorrente a melhor álbum de 2017. Não acredita? Então escute e tire suas próprias conclusões.

NOTA: 9,5

Moonspell é:
- Fernando Ribeiro (vocal);
- Pedro Paixão (guitarra/teclado);
- Ricardo Amorim (guitarra);
- Aires Pereira (baixo);
- Miguel Gaspar (bateria).

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